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Calmaria 26/11 >> 20/12/08

Calmaria

26/11 >> 20/12/08
26/11 >> 20/12/08
Thiago Rocha Pitta
Calmaria
Sobre

Em Calmaria, uma tela (11m de comprimento X 5m de largura) presa na calha atravessa o espaço expositivo debruçando-se até o chão. Na parte superior, uma nuvem de cristais de sal absorve e aglutina a umidade do ambiente, fazendo com que a água gasosa se torne gradual precipitação – chuva leve que derrama e se imprime sobre a superfície da tela. Uma vez montada, esta situação artificial detona todo um movimento de transformação dos estados da matéria, além da constante ação da gravidade – o pingar da água líquida – que já independe de qualquer força ou vontade humana.

É interessante, entretanto, que este ciclo contenha algo intrínseco do processo pictórico: a acumulação da passagem de tempo, o acréscimo ontológico de conter este movimento; tal como a pintura guarda as pinceladas que lhe investem ou retiram. A isto se junta o fato de que a tela tenha sido assada, o que proporciona uma diversidade cromática e reforça a tensão constante entre umidade e secura, presente na dupla sal e água. Configurada uma imagem, volta-se ao deslocamento propriamente espacial: a tela entrecorta os dois andares da galeria, impossibilitando ao observador abarcá-la toda, em uma só visada – proposição de uma qualidade também muitas vezes pictórica de ativar a imaginação de um vir a ser. Reforça-se o ciclo natural que faz a obra, tanto a tela como a chuva caem do alto buscando o chão.

Em peça de menor dimensão (113 x 158 cm), um papel queimado é emoldurado em uma caixa de vidro que contém, em sua superfície, outra nuvem de sal cristalizado. Separados dez centímetros entre si, os dois materiais encontram-se em uma relação estática – a nuvem e sua sombra; o movimento agora é totalmente imaginativo.

O interesse por matérias essencialmente transmutativas também estimula o vídeo Prototide (14’ min.). Filma-se o encontro da massa incandescente de um braseiro armado em uma praia com a água do mar que avança sobre ele. A força motriz está, novamente, em um ciclo natural contínuo, a maré; mas agora a confrontação é mais dramática, se debruça sobre a fugacidade deste jogo de matérias amorfas. Em relação dinâmica com a história da arte, Thiago Rocha Pitta já havia recordado o pintor inglês romântico Turner quando atou fogo a um barco que flutuava no mar e filmou sua transformação, denominando o vídeo Homenagem a William Turner (2002).

Fechando a exposição tem-se Cinema Fóssil, no quintal da galeria. Um buraco retangular cavado no chão e preenchido com carvão em brasas é visível a partir dos reflexos que produz em um espelho de aço inox. A agitação quase hipnótica do fogo que se apaga – será aceso uma só vez na abertura da exposição – é intermediada por esta espécie de tela de cinema arcaica. Este ato de ocultar mostrando situa a obra em uma problematização contemporânea, no sentido de saber-se sempre rodeada por uma infindável cultura de imagens e reproduções, de um circuito que dissolve a potência da imagem.