O artista mineiro Amilcar de Castro (1920-2002), um dos pilares da escultura contemporânea brasileira, ficou conhecido como inventor de uma técnica que, nos anos 1950, revolucionou a arte tridimensional brasileira: o corte e dobra, uma operação em que chapas de ferro retorcidas e dobradas interagem com o espaço para criar figuras geométricas.
A despeito de evocar um procedimento histórico dos suprematistas, que partiam do plano para conquistar a tridimensionalidade, essa operação se distancia da vanguarda russa do início do século XX. Foi somente na segunda metade daquele século que os artistas brasileiros retomaram as experiências dos primeiros construtivistas (e nesse movimento entra Amilcar com seu corte e dobra, transformando desenhos sobre papel em esculturas).
Escultor, gravador, desenhista, designer gráfico e professor, Amilcar tornou-se uma referência para artistas contemporâneos que seguiram essa trilha, aberta nos anos 1950, quando a linguagem abstrata ganhou tração no Brasil com o advento de uma geração marcada pela arte concreta e pelo desenvolvimento da moderna arquitetura brasileira, traduzida na construção de Brasília.
Formado como artista pelas mãos do pintor Guignard (1896-1962) e do escultor Franz Weissmann (1911-2005), Amilcar aprendeu com o primeiro a lição da irreversibilidade da obra escultórica, usando, em seu curso de desenho, o lápis duro, que inviabiliza qualquer tentativa de apagar o traço firme do grafite hard número 7.
De Weissmann, ele adotou o rigor da sintaxe construtiva e a síntese formal, mas restou uma diferença básica entre as obras dos dois, a despeito do pensamento estrutural que os unia. No caso de Weissmann, suas esculturas também partem do plano, mas têm como meta reproduzir o movimento de uma fita, como fez Max Bill (1908-1994). Na escultura de Amilcar, não existe sugestão de movimento. Prevalece a inércia, como se o tempo estivesse em suspensão.
De qualquer modo, foi o impacto de ver a obra Unidade tripartida, do suíço Max Bill, exposta na 1ª Bienal de São Paulo (1951), que levou Amilcar a executar sua primeira escultura construtiva, com a qual participou, em 1953, da segunda edição da mostra internacional. Mas, ao contrário de Max Bill, Amilcar incorporou outros elementos além dos formais que caracterizam o concretismo europeu (e sua adesão ao movimento neoconcreto, em 1959, reafirma seu compromisso com novos procedimentos).
Amilcar não busca exclusivamente uma solução plástica ao abolir a solda nas esculturas de ferro. Partindo de um plano, seja retangular ou circular, para interagir com o espaço e criar um objeto tridimensional, o artista evita repetir o procedimento convencional da escultura, de adicionar ou subtrair matéria. Em outras palavras, Amilcar foi além de Max Bill, ao incorporar nas peças a presença do tempo (no caso, a ferrugem das placas de metal) como atestado de sua ligação com a história e a natureza de Minas.
Embora a técnica do corte e dobra seja fundamental na obra do artista mineiro, ele trabalhou com outros materiais, entre eles a madeira, o vidro e o granito. As esculturas de madeira negra (baraúna) que produziu no fim da vida são obras menos conhecidas que as de ferro e aço corten, mas formam um conjunto que, ainda que pouco visto, é igualmente importante.
Essa inquietação experimental chamou a atenção não só no Brasil. Nome de referência da escultura internacional, o norte-americano Richard Serra (1938-2024) ficou deslumbrado ao ver, há dez anos, uma das obras da série corte e dobra no jardim da Casa da Gávea, sede do Instituto Moreira Salles no Rio de Janeiro. Identificando-se com a obra de Amilcar, Serra viu nele um novo parceiro que, não sendo minimalista, acreditava, porém, que menos é sempre mais.
Milão, Itália
Porto Alegre, Brasil
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