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Fundamentos da Pedra 20/05 >> 24/06/23

Fundamentos da Pedra

20/05 >> 24/06/23
20/05 >> 24/06/23
Lais Myrrha
Fundamentos da Pedra
Sobre

Fundamentos da Pedra é a nova exposição individual de Lais Myrrha (1974, Belo Horizonte, MG) na Millan. A mostra apresenta os novos desdobramentos na pesquisa de Myrrha, artista que em 2021 ocupou o octógono da Pinacoteca, em São Paulo, com um projeto in situ no qual reproduziu a geometria da cúpula do Senado Federal em Brasília.

Myrrha elegeu a “Pedra fundamental de Brasília”, um pequeno obelisco erguido em Planaltina, DF, no ano de 1922, como a como ponto de partida para Fundamentos da pedra. Feito de concreto armado e alvenaria, o monumento foi criado muito antes que a capital projetada por Oscar Niemeyer e Lúcio Costa começasse a ser desenhada. O trabalho que dá nome à mostra é uma série de seis esculturas em que a artista fragmenta o obelisco, de modo a tornar sua estrutura aparente como se fossem estágios de sua construção. Construídos em polipropileno de alta densidade e revestidos em cimento, vergalhões e madeiras nobres (muitas vezes comercializadas ilegalmente), as peças funcionam como alegorias de uma ficção que explicita o descompasso entre os discursos sobre a modernização do país e sua realidade industrial e tecnológica, ou da tentativa de unir aspectos ou materiais divergentes.

“Compreendi que a pedra fundamental de Brasília era uma representação, um modelo ou uma maquete de um monumento genérico (o obelisco), cuja alvura talvez sirva apenas para esconder as marcas deixadas no concreto pela ponta dos dedos dos trabalhadores e da fôrma precária usada em sua construção”, escreve a artista sobre a mostra. “Percebi que aquele triste monumento contrabandeava, de modo insólito e silencioso, operações econômicas e sociais advindas desde o Brasil colônia. Era mais do que uma maquete. Era quase um ensaio daquilo que veio a seguir, a construção de Brasília.”

Myrrha também apresenta os inéditos Penduricalhos, nos quais o quadriculado das armações de ferro utilizadas para fundações na construção civil se tornam suporte para discutir o grid racional das cidades e da arte moderna, e os desenhos O que se faz com o que se tem —ambos parte da série Problemas Fundamentais (2023). Entre outros trabalhos novos, a artista também exibe pinturas da série Estudo de caso: Kama Sutra, na qual tensiona a acomodação de ideias coloniais em relação as empreitadas de modernização do país.

O conjunto de obras na exposição são exemplares da densa pesquisa de Myrrha sobre os aspectos simbólicos, históricos e políticos da arquitetura modernista, da cidade de Brasília e do projeto de modernização do país — também visível em projetos como os apresentados no 37º Panorama de Arte Brasileira, MAM-SP, na 32ª Bienal de São Paulo, onde a artista ocupou o vão do pavilhão projetado por Niemeyer ou, ainda, no Projeto Gameleira 1971, no Pivô, no edifício Copan, do mesmo arquiteto.

Deslocando e reconfigurando elementos da arquitetura moderna, a artista revela os pontos cegos do projeto de modernização brasileira, demonstrando não apenas o descompasso entre o discurso e as condições tecnológicas locais, como a manutenção de lógicas coloniais para a implementação desse plano. Em Fundamentos da pedra, se revela o aspecto de ficção do projeto moderno, daí a necessidade de se construir cenografias, aplicar maquiagem e lançar mão de acessórios, penduricalhos e engodos.

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