Um sobrevoo pelo céu. Raios de sol atravessam as nuvens e tocam o chão, a água, a terra. As gotas que se acumulam em parte ou outra dessa amplidão azul condensam-se, transformando tal espaço. O vento sopra e invade a atmosfera inabitada por seres humanos, mas coberta por moléculas, que resistem e espalham-se. Aliás, é como se tivéssemos por alguns segundos parte de nossos átomos soltos no ar, observando esse espetáculo natural, e nos déssemos conta durante tal andança da nossa significância no mundo, tão singela quanto miúda, perto da imensidão que nos envolve.
As palavras parecem alcançar apenas parte do que a pintura da mineira Fran Chang nos faz sentir. As obras são como janelas, pelas quais é possível vislumbrar um mundo fantástico, que mistura o real e o imaginário em direção a lugares que podemos por ventura vir a conhecer pelo cosmo. Uma espécie de choque entre céu e terra, paisagens submarinas e estelares, que se espelham na criação de um novo mundo. O universo, inclusive, serve como base para esse salto sobre-humano da artista em direção à pintura. Bacharel em Artes Visuais pela Belas Artes de São Paulo, Chang fez extensão de seu curso em Astrofísica pela UFSC e Astronáutica pela UFSC. Esta formação lhe dá um olhar que viaja anos luz, destrinchado delicadamente pelas finas cerdas de seu pincel, que atravessam a seda, tecido primordial em seu ateliê.
De ascendência asiática, Chang traz mais que as características físicas de tal relação com o lado oriental da terra. Sua mãe nasceu na Taiwan e de lá trouxe costumes, estudos e ensinamentos passados de forma orgânica à filha, como o amor pelas técnicas manuais, pela moda e pela costura. Assim, antes de dedicar-se à pintura, Chang envolveu-se em tecidos e seguiu com seus olhos atentos a rota daquele que escolheria para esticar em seus chassis. A transparência da trama é um dos pontos inerentes de sua obra, que deixa a luz do ambiente fazer seu papel transformador em cada peça. A luz é parte fundamental da criação da artista, tanto a que ela própria desenvolve através das cores que elege para compor as pinturas, quanto a que perpassa pelo mundo que habitamos e realça cenas específicas da imagem que se integra em nossa frente.
Nas artes, trabalhou no núcleo de restauração e conservação na Pinacoteca do Estado de São Paulo, e foi assistente de nomes potentes da arte contemporânea atual, como Sofia Borges. A convite da curadora convidada da Bienal de 2018, realizou uma reativação da obra do Tunga, através da performance. De tais experiências, partiu em voo solo e logo foi laureada com o prêmio Itaú Cultural Arte como Respiro, em 2020. Tal universo de referências condensasse na mostra em cartaz na Verve Galeria, em São Paulo. O espaço, comandado pelo artista Allann Seabra e pelo arquiteto Ian Duarte, descobriu a produção delicada da artista em pesquisas pelo mundo virtual durante a atual pandemia sanitária, que tanto promoveu encontros cibernéticos frutíferos. Afinal, da escuridão faz-se a luz.
Mais que tudo, Chang é a tradução livre da tríade discutida por Platão, que transcorre sobre o bom, o belo e o verdadeiro. Seu universo é cheio de verdades. Não existem meias palavras em seu repertório, apenas o clarão que chega como luz diretamente aos olhos do espectador. A magia de sua produção é ciência, mas também poesia. É mar com estrelas.
Rio de Janeiro, Brasil
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São Paulo, Brasil
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Bréscia, Itália
São Paulo, Brasil
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Gwangju, Coreia do Sul